sexta-feira, 31 de julho de 2009

DIÁSPORA ARMÊNICA


O Comitê de Relações Exteriores da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos aprovou uma moção que reconhece como genocídio o assassinato em massa de armênios por turcos otomanos durante a Primeira Guerra Mundial. A votação, por 27 a 21, suscitou a reação do presidente da Turquia, Abdullah Gul, que qualificou a medida de "inaceitável".

A hercúlea decisão do comitê da Câmara americana causou, lamentavelmente, polêmica, pois entrou em ponto espinhoso da história de turcos e armênios.

Comunidades armênias em várias partes do mundo lutam há décadas para que o massacre de seu povo pelos turcos otomanos entre 1915 e 1917 seja reconhecido como o primeiro genocídio do século 20.

Muitos historiadores no Ocidente acreditam que a morte daquelas centenas de milhares de pessoas pode ser considerada como tal. Mas outros países, por merar questiúnculas diplomáticas e econômicas, recusam-se a rotular o episódio histórico como tal.

O artigo 2º da Convenção da ONU sobre Genocídio, de dezembro de 1984, descreve o genocídio como atos realizados com a finalidade de "destruir, em todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso".

Durante a Primeira Guerra Mundial, o Império Otomano - que enfrentava a Tríplice Entente, formada por Grã-Bretanha, Rússia e França - convocou todos os seus homens para lutar. O recrutamento, porém, não foi bem recebido por muitas das minorias étnicas e religiosas do Império. Os armênios eram um dos grupos que se rebelaram contra a guerra, e a opressão do governo central. Muitos se uniram ao inimigo.

Em 24 de abril de 1915, autoridades otomanas reuniram e mataram centenas de líderes armênios; outros foram deportados. Em maio, a comunidade armênia, com dois ou três milhões de pessoas, foi forçada a deixar o Império Otomano.

A comunidade armênia diz que, os dois anos seguintes, aproximadamente 1,5 milhão de armênios teriam sido mortos pelos turcos. Muitos padeceram na fuga para a Síria e a Mesopotâmia (atual Iraque).

Até hoje, muitos armênios acreditam que foi o massacre de seu povo que abriu caminho para o Holocausto. "Afinal, quem se lembra do aniquilamento de armênios?", teria dito Hitler.

Para a Turquia, visando esquivar-se da responsabilidade e amputar-lhe da história o hediondo crime cometido, o número de armênios mortos é em torno de 300 mil - um número alto, mas não maior que o de turcos que também morreram na época. Para o governo turco, as mortes foram mero resultado de uma guerra civil, agravada pela fome e doença que castigaram o decadente Império.

Cerca de 20 países já reconheceram formalmente que os turcos otomanos perpetraram genocídio contra os armênios, entre os quais a Argentina, Bélgica, Canadá, França, Itália, Rússia e Uruguai. A Grã-Bretanha, os Estados Unidos e Israel, ironicamente, empregam terminologias diferentes e evitam o termo.

Até hoje, Armênia e Turquia não mantêm relações diplomáticas. A fronteira comum entre os dois paises permanece fechada.

Os armênios continuam sendo um dos povos mais dispersos do mundo. Não há números exatos sobre os armênios da diáspora, mas estima-se que as maiores comunidades fiquem na Rússia, com mais de 2,2 milhões, e Estados Unidos, com 1,2 milhão. Também há grandes comunidades na Geórgia, França e Irã, entre outros. No Brasil, o número de armênios fica entre 60 a 70 mil.

Logo após o fim da Primeira Guerra Mundial, foi proclamada a República Independente da Armênia, que durou apenas até o início dos anos 20, quando o país foi incorporado à União Soviética. Em 1991, a Armênia, porém, reconquistou sua independência e embarcou em um programa de reformas econômicas que trouxeram relativa estabilidade e crescimento ao país, que ainda possui altos índices de pobreza e desemprego.

Na Turquia, o código penal - "sabiamente" - proíbe qualquer "pedido de reconhecimento do genocídio armênio". No fim de 2006, Ancara protestou contra uma lei do Parlamento francês que, ao contrário, proibia a negação do episódio.

Apesar da tensão entre Turquia e França - a aquela suspendou os laços militares com esta, em retaliação - a União Européia, contudo, esclareceu, ao arrepido dos sentimentos de um povo - que a posição do governo turco sobre a história não interfere em uma possível aceitação do país no bloco.